Eve da Embraer avalia instalar fábrica nos EUA para enfrentar barreiras tarifárias

Subsidiária de mobilidade elétrica estuda unidade nos Estados Unidos para driblar sobretaxa de 50% e manter competitividade no maior mercado de aviação regional do mundo.

  29 DE JUL, 2025


Eve da Embraer avalia instalar fábrica nos EUA para enfrentar barreiras tarifárias

A Eve Air Mobility, subsidiária da Embraer voltada para o desenvolvimento de aeronaves elétricas de decolagem e pouso vertical (eVTOLs), avalia a construção de uma fábrica nos Estados Unidos como resposta à intensificação da guerra comercial entre Brasil e EUA. A medida surge em meio à iminente imposição de tarifas de 50% sobre exportações brasileiras de aeronaves, prevista para entrar em vigor em agosto, e que pode comprometer de forma decisiva a competitividade da empresa em seu principal mercado.

Segundo o CEO Johann Bordais, aproximadamente 70% da carteira de pedidos da Eve é composta por clientes americanos. Esse dado, somado à pressão tarifária, transforma a decisão de ampliar a produção fora do Brasil em questão estratégica. A empresa já havia planejado um modelo de montagem flexível, com capacidade de finalizar a produção em diferentes mercados, justamente para lidar com cenários de instabilidade logística ou comercial.

Atualmente, a planta de Taubaté, no interior de São Paulo, opera com capacidade inicial de 120 aeronaves por ano. O projeto prevê expansão gradual para até 480 unidades anuais, mas a demanda crescente, aliada ao risco das sobretaxas, coloca em evidência a necessidade de uma nova unidade fabril. Com um backlog global estimado em quase 3 mil pedidos e valor superior a US$ 14 bilhões, a Eve busca garantir previsibilidade operacional e segurança para seus clientes internacionais.

O impacto das tarifas sobre as exportações da Embraer preocupa também a matriz. Francisco Gomes Neto, presidente-executivo da Embraer, já declarou que a medida pode afetar a receita da companhia de forma comparável à crise da Covid-19, quando a demanda global por voos despencou. De acordo com análises de mercado, cada aeronave enviada do Brasil aos Estados Unidos poderia sofrer um custo adicional de até US$ 9 milhões devido à nova taxação. Embora ainda não haja registros de cancelamentos formais de pedidos, o temor é que parte da carteira seja renegociada ou adiada caso não haja alternativa de montagem local.

A Embraer, no entanto, conta com um diferencial importante: já possui linhas de montagem em solo americano, voltadas sobretudo para jatos executivos. Isso torna a empresa menos vulnerável que outros exportadores, uma vez que aeronaves montadas nos EUA tendem a ser isentas da sobretaxa. Além disso, os modelos regionais da Embraer atendem às chamadas scope clauses, cláusulas sindicais que limitam o tamanho e peso de aeronaves operadas por companhias regionais americanas. Atualmente, não existe concorrência direta para esse nicho, o que fortalece a posição estratégica da fabricante.

Para a Eve, a abertura de uma fábrica nos EUA representaria mais do que uma manobra para driblar tarifas. Seria também um passo relevante na consolidação global da mobilidade aérea elétrica. Produzir próximo ao cliente significa reduzir custos logísticos, encurtar prazos de entrega e aumentar a confiança de investidores e parceiros, especialmente em um setor emergente que exige robusta certificação regulatória e adaptação tecnológica constante.

A discussão vai além do caso Embraer. O movimento reforça a importância da indústria brasileira adotar estratégias de escalabilidade e flexibilidade produtiva. Em tempos de instabilidade comercial, depender exclusivamente de plantas locais pode se transformar em risco sistêmico. A experiência da Eve mostra que a engenharia estratégica, com capacidade de adaptação geográfica da produção, pode ser a diferença entre perder contratos bilionários ou consolidar liderança global.

No curto prazo, a decisão deve mexer não apenas com a cadeia logística da Embraer, mas também com fornecedores brasileiros, que podem ver parte da demanda transferida para o exterior. No médio e longo prazo, o setor terá de refletir sobre a necessidade de maior blindagem frente a disputas comerciais internacionais.

A Eve se posiciona, assim, diante de um dilema que pode definir seu futuro: manter a centralidade de sua produção no Brasil ou ampliar sua presença em solo americano para proteger o coração de sua carteira de pedidos.


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